No final do longínquo ano de 2012 — sim, aquele mesmo onde disseram que tudo iria acabar — eu decidi que faria uma faculdade. Na época, influenciado e incentivado por minha atual namorada — hoje esposa —, que havia finalizado o ensino médio há poucos anos. Então decidi que embarcaria nesta longa viagem e acreditava que isso mudaria a minha vida.

TLDR: Mudou, mas nem de perto o quanto eu acreditava que mudaria.

Placa que aponta direções direfentes, representando as escolhas da vida Photo by Javier Allegue Barros on Unsplash

Um pouco de história

Faculdade não é algo novo em meus pensamentos. Houve uma época em que eu sonhava fazer faculdade, trabalhar em algo importante que me fizesse feliz e, principalmente, que me desse condições de ajudar minha família e, quem sabe, poder dar uma casa para minha mãe. Sim, eu costumava ser uma pessoa sonhadora, mesmo que a minha origem fizesse de tudo para que eu não sonhasse.

Nascido em uma família pobre na metade dos anos 80, não tenho muitas lembranças de quando era pequeno, mesmo quando olho algumas das poucas fotos da época. Uma das minhas primeiras lembranças de quando era criança, são de por volta de 1993 e 1994. Me lembro de assistir corridas de Fórmula 1 e chorar quando o Senna batia e saía da corrida. Mal sabia eu que naquele 1º de maio de 1994, dia no qual eu estava olhando a corrida, aquela batida do Senna seria a última.

Na época de escola, até o 8º ano, confesso que não me lembro de ter pensado sobre carreira, faculdade ou qualquer coisa do tipo. Lembrando: minha família era bem pobre e, quando se é pobre, fica muito difícil de pensar ou sonhar com qualquer coisa.

No ensino médio, comecei a pensar no que eu faria depois, ou melhor, o que eu tentaria fazer. Ainda no ano de 2001, sequer pensar em fazer uma faculdade era algo fora de alcance. Mesmo assim, comecei a sonhar com isso. Os dois cursos que tinha na cabeça eram Fotografia e Moda. Eu adorava desenhar e desenhava muito bem — ao menos naquela época —, então pensava que seria algo que eu gostaria de seguir. Mas logo a realidade me puxou para o chão, abafando cada vez mais esses “sonhos”, até que eles sumiram.

Eu e a tecnologia

Em 2008 comecei a trabalhar com tecnologia. Fiz um curso piloto que era uma parceria entre uma escola técnica e algumas empresas, e essa foi a minha porta de entrada para o mundo da tecnologia.

Eu já brincava com algumas coisas em casa, pois no meu primeiro trabalho com carteira assinada, lá em 2006, usei o meu 3º salário para comprar um computador (parcelado em um carnê de loja). Para quem não faz ideia do que estou falando, é como fazer uma compra parcelada no cartão de crédito, porém eles te davam um carnê com diversos boletos e tu pagava eles todos os meses — parece loucura, mas é verdade.

Eu poderia facilmente dizer que a melhor escolha da minha vida foi começar a trabalhar com tecnologia, e provavelmente é verdade, mas creio que só trabalhar com tecnologia não me teria me trazido até onde estou hoje, então segue a ideia.

A melhor escolha

No final de 2012, fui influenciado pela minha então namorada — agora esposa —, que havia terminado o ensino médio há pouco tempo. Então acabei decidindo embarcar nessa longa viagem, acreditando que isso mudaria a minha vida.

Mas antes de tudo, eu sabia de uma coisa: era IMPOSSÍVEL pagar por uma faculdade, totalmente fora de cogitação. Por isso, decidi me matricular no início de 2013 fazendo apenas uma disciplina — que consumiria 40% do meu salário na época — e depois faria a prova para tentar uma bolsa integral.

Foram dois anos até que, no final de 2014, consegui uma bolsa pelo ProUni, e isso tirou um peso muito grande das minhas costas até na questão financeira, pois já estava quase impossível de bancar. Além disso, podemos dizer que foi no último momento, porque eu já tinha concluído que, se não conseguisse a bolsa, largaria a faculdade no próximo ano. Era um valor muito alto que nunca teria de volta.

Falei sobre o início do curso e a bolsa, mas não falei sobre o que é parte da melhor escolha que já fiz na minha vida.

Escolher o curso foi um pouco difícil no começo, afinal a “melhor escolha” seria um curso de tecnologia — área profissional na qual eu atuava e que eu gosto muito . No entanto, quando comecei a pesquisar sobre os cursos da área e vi as grades curriculares e os conteúdos de cada um deles, o sentimento que melhor descreveria o que senti é frustração.

Cerca de 80% a 90% do currículo de todos os cursos mostrava coisas que eu já sabia ou então tinha estudado por conta própria para melhorar o meu trabalho; e isso certamente me deixaria frustrado e desanimado já nos primeiros semestres.

Portanto, comecei a olhar outras coisas, e podemos dizer que, no fim, a minha escolha acabou sendo um mix da minha área profissional com o que eu sonhava há muitos anos. O curso escolhido foi Design.

Eu trabalhava em desenvolvimento web com foco em front-end, então senti que esse curso poderia agregar bastante no meu dia a dia e em como eu enxergo e faço o meu trabalho. E eu estava certo. Estudar Design mudou completamente a minha visão tanto sobre o mundo quanto sobre o meu trabalho. Me fez entender muito melhor o meu trabalho e também o trabalho das pessoas em outras funções ao meu redor.

A melhor escolha que fiz na minha vida foi, sem sombra de dúvidas, fazer faculdade de Design.

A pior escolha

Pode ser estranho o que vou dizer, e será.

Por muito tempo na minha vida, fui uma pessoa que criava expectativas demais sobre as coisas e as pessoas. Nem preciso dizer que isso quase sempre me deixava triste e desanimado.

Geralmente as coisas não ocorrem como a gente imagina, muito pelo contrário. A vida foi me ensinando isso devagar e dolorosamente durante anos, principalmente quando eu era mais novo.

Na época em que comecei a faculdade, eu já era uma pessoa que quase não criava expectativas, afinal, sabia que isso não me faria bem. No entanto, estava empolgado com o curso, com o que aprenderia nele e também sobre o universo que me seria apresentado e tudo o mais. Até pouco mais da metade do curso essa empolgação só crescia — hoje, olhando para trás, vejo que relevei as coisas que não eram nada empolgantes —, mas, aos poucos, essa empolgação passou a diminuir e, com isso, veio a “dor” junto de uma imensa falta de vontade e ânimo em continuar.

Conforme vamos entendendo mais sobre um determinado assunto, é normal que ele deixe de nos empolgar e comece a parecer não tão interessante para nós. Mas isso nem sempre precisa ser verdade.

Os problemas que eu enxergava no curso, na instituição e até em alguns professores já haviam passado a ser algo muito maior do que a empolgação com a área de estudo. O fato de estudar Design muito provavelmente me fez ser mais crítico e analisar melhor tudo isso, além de conseguir notar esses problemas que antes nunca conseguira enxergar.

O currículo do curso, apesar de ser “generalista”, é muito focado em produto — muitas vezes no setor calçadista, que, no passado, era o que movia a cidade em que a universidade está localizada, porém já não é uma força há mais de uma década. A falta de disciplinas focadas no digital — um dos principais geradores de emprego na área, que só cresce a cada ano — é desanimador.

E a lista só aumenta…

Professores ótimos sendo dispensados ou deixados de lado. Pouquíssimas contratações à altura dos profissionais anteriores. Diversas disciplinas sem muito conteúdo relevante ou onde o conteúdo é apenas cases de marca. Falta de coerência em avaliar os trabalhos em diversas disciplinas — e aqui não estou falando de notas, mas sim de analisar um trabalho de design e apontar coisas que não estão boas, além de cobrar justificativas das escolhas para a solução. SNo geral, não havia essas críticas necessárias — salvo alguns professores que faziam isso de forma impecável.

Para o Everton de hoje, fazer faculdade ou até mesmo continuar nela foi a pior escolha da minha vida. É bastante tempo e desgaste demais para um retorno muito pequeno. Infelizmente.

Conclusão

Enfim… Tudo isso me faz chegar a este impasse curioso. Ou melhor, algo que pensei que fosse um impasse por muito tempo, mas, na verdade, não é. Em momentos diferentes, uma mesma coisa pode ser a melhor e também a pior escolha da vida e, ainda assim, uma não anula ou desmerece a outra.

E o que eu quero dizer com tudo isso? Estranhamente, hoje eu não tenho nenhuma vontade de continuar a faculdade, mesmo faltando apenas três disciplinas para finalizar. Apesar disso, escolher fazer Design foi a melhor ou uma das melhores decisões que tomei na minha vida. E sou muito feliz por isso.

Um dos melhores professores que eu tive me ensinou sobre História da Arte da forma mais incrível que eu possa imaginar. Um professor que, às vezes, me fazia sair das aulas com os olhos cheios de lágrimas, e também com uma força e empolgação que só a aula dele me fazia sentir.

Um trecho de algo que ele dizia ainda permeia ios meus pensamentos mesmo depois de vários anos:

Conforme tu for se tornando designer, tu vai ver o mundo de forma diferente. Muitas vezes, isso vai acabar te deixando tão chateado que, em diversos momentos, tu vai pensar “eu queria poder voltar a ser ignorante de conhecimento e não ver as coisas de forma tão clara”. E, nesses momentos, tu deve olhar para o outro lado e pensar, mas agora que eu vejo, eu posso mudar as coisas… eu posso mudar o mundo aos pouquinhos.

Até mais e obrigado pelos peixes.